É comum, para quem trabalha em rádio, ver pessoas ficarem nervosas em frente ao microfone. De repente alguém muito articulado fica com a voz fraca ou falando tal qual um robô, de forma reta, sem interpretação. Existem também aqueles que sofrem uma amnésia seletiva em frente a latinha.
Não posso falar por todos, mas para mim parte desse nervosismo aparece quando penso que junto ao alcance de muitas pessoas vem o escrutínio e o julgamento de muitos também. Qualquer erro cometido por mim ou por não saber lidar com imprevistos pode ser amplificado, reverberado… e deus me livre de acabar virando algum meme (ok, talvez eu pense muito nas coisas e precise ver um psicólogo).
O medo é uma reação natural ao desconhecido, mas quem quer trabalhar no ar precisa aprender a lidar com qualquer insegurança e domar estes sentimentos. E isso, somado a outras habilidades, nos presenteou com excelentes comunicadores.
Um com o qual tive o prazer de trabalhar foi o França. Ou, como gosta de se apresentar, Wilson Leonel Pinto de França (Leonel por parte de mãe e Pinto por parte de pai, faz questão de explicar). Dizem que sempre foi um cara muito bem articulado, com uma ótima memória e muito conhecimento na bagagem. Falava sobre filosofia, história, música, esporte e qualquer outro assunto que precisasse, sem roteiro e por horas, se precisasse.
Certa vez, enquanto eu estava trabalhando no final de semana, operando na FM, alguém me ligou pra avisar que o operador da AM não conseguiria ir e que haveria um jogo para transmitir. Não era um jogo do JEC (time mais conhecido daqui da cidade), que mobilizava toda a equipe esportiva, só um campeonato regional que comprou horário pra ser transmitido. Pediram que eu operasse pra que eles pudessem honrar com seu compromisso, mas expliquei que ainda não conseguia estar em 2 locais ao mesmo tempo.
Por fim, acertamos que eu colocaria a vinheta de abertura da jornada esportiva e o narrador, grampeado no telefone, logo na sequência. Voltaria para minhas funções no outro estúdio e retornaria apenas 1 hora e meia depois, no fim do jogo, pra engatar a programação musical. Obviamente questionei se o profissional em campo conseguiria dar conta de fazer todas as funções por todo esse tempo sozinho, e me garantiram que o Chineque (apelido do França aqui na empresa) tinha quase 50 anos de experiência no rádio e dava jeito. E assim aconteceu.
Quando o conheci melhor ele contou o porquê do apelido. Quando era mais jovem e estava voltando de uma festa de manhã cedo com uns amigos e uns “brotos”, alguém sugeriu que parassem na padaria pra comprar chineque (ou pão doce com farofa, para os não familiarizados). Sem grana pra bancar sequer o dele, usou seu improviso pra tentar escapar: “Não acho uma boa ideia… é que chineque me dá dor de dente”.
A desculpa certamente não colou. A risada foi geral, a história se espalhou e o apelido pegou. Tudo porque na hora, não querendo fazer feio com as gatinhas, ele travou e não conseguiu pensar em uma desculpa melhor… Parece que o nervosismo pode afetar até os mais competentes, só os motivos que são diferentes.
Pelo que parece eu sofro de “…sofrem uma amnésia seletiva.” Mas, lendo todo seu texto foquei mais tranquila. Posso melhorar isso roteirizando o programa. Obrigada!